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IMAGINAÇÃO E PROFECIA NA OBRA DE VIEIRA
Lélio Fernando Martins
(Faculdades Integradas Maria Thereza)
leliomartins@gmail.com
Roberto Silva de Souza
(Centro Universitário de Itajubá)
robertossouza@yahoo.com.br
Resumo
Este artigo pretende discutir as relações entre imaginário e futuro nos escritos proféticos do padre Antônio Vieira. Neste sentido, serão utilizados trechos das obras Esperanças de Portugal, História do Futuro e Clavis Prophetarum (Chave dos Profetas), três de suas principais obras nas quais o tema é a profecia. Para a análise do assunto, autores como Gilbert Durand, Monique Augras e Luiz Felipe Baêta Neves serão a principal referência, pela importância de suas reflexões em torno do imaginário e da obra de Vieira.
Palavras-chave: imaginário; futuro; profecia; Antônio Vieira
Abstract
This article intends to discuss the relationship between imaginary and future in the prophetical writings of the father Antônio Vieira. So, will be used excerpts of the works Esperanças de Portugal, História do Futuro and Clavis Prophetarum (Chave dos Profetas), three of his main works in which the theme is the prophecy. To analyze the matter, authors such as Gilbert Durand, Monique Augras and Luiz Felipe Baêta Neves will be the main reference, due to the importance of their reflections on imaginary and the work of Vieira.
Keywords: imaginary; future; prophecy; Antônio Vieira
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Escrever o passado pode-o fazer o estudo narrar
o presente facilita-se com o trabalho, mas dar
notícia do Futuro tem ilustração superior, não
cabe na esfera do entendimento humano.
D. Joseph Pereyra de la Cerda
Prior-mor da Ordem de Santiago
Introdução
Desde alguns anos, os estudos sobre o imaginário têm se multiplicado. No âmbito das pesquisas científicas e/ou acadêmicas, as alcunhas de “maldito”, “indigno”, “impróprio” têm sido cada vez menos utilizadas para designá-lo. Consagrados autores estrangeiros, como Gaston Bachelard, Gilbert Durand, Cornelius Castoriadis e, no Brasil, Monique Augras, Luiz Felipe Baêta-Neves, Roberto da Matta, dentre outros, vêm se ocupando do assunto em seus trabalhos e pesquisas, descortinando possibilidades de ampliação do tema.
Tanto Augras (2000) quanto Durand (2001a, 2001b) mostram entusiasmo quanto às mudanças em relação ao status dos estudos sobre o imaginário. Durand, em sua obra O imaginário: ensaio acerca das ciências e da filosofia da imagem, por exemplo, comenta sobre a banalidade das afirmações em torno dos progressos já ocorridos nas técnicas de reprodução de escritos:
Por conseguinte, torna-se fácil imaginar que uma inflação de imagens prontas para o consumo tenha transtornado completamente as filosofias, que até então dependiam do que alguns denominam ‘a galáxia Gutemberg’, isto é, a supremacia da imprensa e da comunicação escrita – com sua enorme riqueza de sintaxes, retóricas e todos os processos de raciocínio – sobre a imagem mental (a imagem perceptiva, das lembranças das ilusões etc.) ou icônica (o figurativo pintado, desenhado, esculpido e fotografado...). (DURAND, 2001, p. 5-6)
Augras propõe tratar como positivas as abordagens que consideram o imaginário dentro da ordem da racionalidade. Esta perspectiva, segundo a qual o imaginário é fonte de criação e de construção mútua da sociedade e do sujeito, será a adotada neste artigo. A mesma autora lembra, contudo, que há uma forte tradição intelectual e acadêmica que concebe o imaginário negativamente, ou seja, o vincula à irracionalidade e o aproxima do delírio, do devaneio e da loucura. Tal concepção é advinda da perspectiva socrática, seguida por Platão e principalmente por Aristóteles, onde tudo se baseia em uma lógica binária, comportando somente dois valores, onde um deles é falso e o outro verdadeiro. Assim, o imaginário, que não se reduz a uma argumentação “verdadeira” ou “falsa”, passa a ser considerado “amante do erro e da falsidade” (DURAND, 2001a, p. 10).
Para Sartre (apud AUGRAS, 2000, p. 109), por exemplo, o imaginário é algo muito próximo de como o senso comum o traduz: algo sem sentido, sem lógica, sem razão. Durand (2001b) chega a fazer
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uma análise do trabalho de Sartre comentando uma passagem em que este último trata o imaginário como “quase nada”. Lacan, por sua vez, ao menos em suas cogitações iniciais (1998), pensa o imaginário como sinônimo de ilusão, alienação (apud AUGRAS, 2000, p. 112) e, sobretudo, sob uma perspectiva evolutiva. Assim, o imaginário seria uma etapa a ser ultrapassada, meramente uma passagem para que o sujeito aceda ao simbólico. Tudo se passa como se, ao falar de imaginário, estivéssemos obrigatoriamente remetidos a um registro genético, o que lança inquirições sobre se a teoria lacaniana do imaginário, afinal, não se revestiria de características fortemente biologizantes. Certamente há muitas divergências entre aqueles diferentes teóricos, no que se refere à sua compreensão sobre o imaginário. Porém, em se tratando de Bachelard, timidamente, e Durand e Castoriadis, mais enfaticamente, o imaginário é tratado como um tema digno de ser pensado acadêmica ou cientificamente.
Este artigo pretende analisar o tema do imaginário, utilizando como recorte os escritos proféticos do padre Antônio Vieira. Consagrado por ninguém menos que Fernando Pessoa como “o imperador da língua portuguesa”, Vieira foi pregador, missionário, escritor, diplomata, e… profeta! No intricado cenário político do século XVII, dentro do qual viveu toda a sua longa existência (89 anos), Vieira destacou-se também como conselheiro real, exercendo importante papel na mediação das relações entre a Igreja Católica e a monarquia portuguesa. Seus escritos proféticos igualmente buscavam articular poder secular e poder temporal, na medida em que falavam do cumprimento dos desígnios divinos com relação ao papel que competiria a Portugal na construção de uma nova ordem mundial. Neste sentido, o imaginário, em Vieira, está fortemente referido a uma determinada concepção sobre o futuro.
Profecias não eram matéria estranha ao século XVII. Era exigido, contudo, daqueles que profetizavam, um rigor interpretativo com relação às Escrituras Sagradas (Neves, 1998), de maneira que não estivessem em conflito com os ditames da Igreja Católica. Se porventura um “profeta” vaticinasse algo que não fosse condizente com os preceitos sagrados, corria o risco de ser tomado como herege, inimigo maior da Igreja; e ainda que viesse apenas a divulgar profecias, se estas fossem consideradas heréticas, ele seria tomado como “heresiarca”, ou seja, aquele que difunde inverdades criadas por um herege (Eymerich, 1993).
Assim, por exemplo, em Esperanças de Portugal, um dos textos proféticos de Vieira, ele defende que o rei “Encoberto”1 seria D. João IV. Este escrito assinala um momento importante na polêmica entre joanistas e sebastianistas, em torno de quem, afinal de contas, seria o rei que, retornado (da morte?) conduziria Portugal novamente a um tempo de fausto e glórias. Os sebastianistas acreditavam que o “Encoberto” era D. Sebastião, desaparecido na batalha de Alcácer-Quibir, no Marrocos, em 1578. A novidade de fazer de D. João IV o “Encoberto” chamou a atenção do Santo Ofício. Esperanças de Portugal foi escrito em 1659, e profetizava sobre eventos começariam a ocorrer a partir de 1666. Desde antes, no entanto, Vieira já entrara no rol dos que veiculavam notícias contrárias às defendidas pela Igreja Católica (Muhana, 1995).
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De acordo com Buescu (1985), Esperanças de Portugal pode ser visto como um esboço do que viria a ser a História do Futuro – outra obra de inspiração profética do jesuíta, que tendo começado a escrevê-la em 1649, terminou-a apenas em seus últimos anos de vida – e uma antecipação de seu escrito profético mais importante: a Clavis Prophetarum (2000). Em Esperanças de Portugal é possível perceber dois aspectos fundamentais do estilo característico de Vieira: de um lado, o pragmatismo e o utilitarismo de quem se aprazia em participar das intrigas palacianas; e de outro, o construtor de grandes e fortes imagens, por intermédio das quais procurava plasmar e antecipar um futuro de esplendores para Portugal e para o povo português (BESSELAR, 2002).
O futuro, pensado em relação às profecias, é sempre esperado a partir daquilo que foi anunciado que um dia aconteceria. É Vieira quem diz:
A verdadeira prova do espírito profético nos homens é o sucesso das coisas profetizadas. Assim o prova a Igreja nas canonizações dos santos; e os mesmos profetas canônicos, que são parte da escritura sagrada, fora dos princípios da fé, não têm outra prova da verdade de suas revelações ou profecias, senão a demonstração de ter sucedido o que eles tantos anos antes profetizaram (apud BESSELAR, 2002, p. 51).
Segundo Monteiro (1967, p. 13) “os vaticínios já cumpridos levam o homem a não repelir os que ainda não o foram”. Mas em que consiste o futuro? Pensar que este é pura e simplesmente “o que está por vir” apequenaria demasiadamente a questão. É certo que o presente pode ser pensado como o tempo em que vivemos o cotidiano de nossas vidas. Mas também é lícito pensar que, ao começarmos uma tarefa, imaginamos seu final como sendo o futuro desejado, ainda que esteja à nossa frente apenas alguns poucos minutos. Por isso, o futuro é perturbador: porque é desconhecido, porque transforma o presente, porque muitas vezes é calcado no passado. Vieira imagina o futuro como uma reprodução do passado, mas que só se tornará possível pelas ações no presente.
O futuro como questão
No Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2000), há diversos sentidos para “futuro”: tempo que sucede o presente, aquilo que está por vir, destino, sorte, entre tantos outros. O grifo nas duas últimas acepções justifica-se por serem as mais relevantes aos temas levantados neste artigo. Tanto destino quanto sorte são palavras que nos remetem a possibilidades futuras. Assim, pensa-se no futuro como algo que trará algo que já é dado – o destino – ou fará com que o encontremos por mero acaso – a sorte.
As outras acepções, mais genéricas, apontam para um depois, um devir, um acontecimento que está adiante do tempo em que vivemos. No caso de Vieira, ele indica as regras sobre como deve ser construído o futuro. Esta construção ocorre através de uma ação no presente. Por isso é tão importante catequizar, estar nas missões, mostrar o Reino de Deus, coadunar o profano e o sagrado. O esforço
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despendido pelo religioso é fatigante. Seus escritos são sempre cheios de referências, muitas das quais evocadas por sua memória – como é o caso de Esperanças de Portugal, que foi escrito durante uma de sua viagens pelo Amazonas, sem poder recorrer aos livros que citava.
Vieira é absolutamente meticuloso em sua preocupação de fundamentar o que escreve. O primeiro capítulo da Clavis Prophetarum, por exemplo, tem o seguinte título: “Será lícito perscrutar os tempos das coisas futuras e estabelecer alguns critérios a esse respeito?” (VIEIRA, 2000, p. 7). Esta é a primeira preocupação do jesuíta em seu texto: como falar das coisas futuras sem entrar em desacordo com as Escrituras? Neste intuito, menciona um trecho bíblico que o leva a pensar justamente que não se deve procurar conhecer o futuro (VIEIRA, 2000, p. 7), apontando o que seria ser contrário ao texto sagrado:
Parece-me ver no limiar deste capítulo, escrita em letras maiúsculas e como que afixada na portada, a célebre frase de Cristo: Não vos pertence a vós saber os tempos e os momentos que o Pai reservou ao seu poder. Por tal motivo, com fundamento se deve temer que o leitor interessado e ávido, atingido por este divino oráculo no vestíbulo da nova disputa, pare um pouco e seja impedido de entrar (grifo de Vieira, por se tratar de citação dos Atos dos Apóstolos, 1; 7).
Conhecer o futuro, portanto, é algo que pertence a Deus, e, para que isto viesse a se tornar uma tarefa cristã, sem se tornar objeto de reprovação, seria necessário o recurso a outros argumentos, também extraídos da mesma fonte, qual seja, a Bíblia:
Por isso, considerei que havia de fazer obra oportuna e indispensável a este passo, se primeiramente, com todo o cuidado, fortificar o acesso com toda a diligência, mostrando que é transitável e está livre de toda a incursão perniciosa e que não há que temer onde não há temor (VIEIRA, 2000, p. 8).
Esse cuidado não era injustificado. Quando escreveu Esperanças de Portugal, Vieira cercou-se de zelo, procurando respaldar seus argumentos em escritos de autoridades, ou seja, de homens de reconhecido caráter e inteligência, e nem assim escapou a um processo inquisitorial. O campo da profecia exigia rigor extremo e isto não passava despercebido ao jesuíta, que procurava, assim, mostrar que não havia o que temer, desde que se seguissem certas regras que possibilitavam um exercício interpretativo sobre aquilo que adviria. Mantendo-se fiel ao estilo de comentar minuciosamente sua própria empreitada, segue Vieira:
Não gostaria que alguém pensasse que eu caí nesta suspeição precipitadamente e sem grande motivo, quando de facto, ao meditar nisso mesmo, vi lançarem-se contra mim tais monstros de horror ou error (...). Por isso, atacando em primeiro lugar aquilo que parece apresentar alguma dificuldade e horror, iremos depois buscar aquilo que devemos sustentar, não às folhas sibilinas que voam como joguetes arrastadas pelo rápidos ventos [sic], mas às sagradas fontes da verdade, isto é, às divinas páginas (VIEIRA, 2000, p. 9).
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Para o jesuíta, o futuro estava previsto em diversos textos: nas lendas milenaristas da Igreja, que crêem na vinda de uma época em que o homem conhecerá mil anos de venturas; nos próprios textos sagrados; e em escritos de profetas de seu tempo, como é o caso do Bandarra2. Somados todos estes elementos, é necessário que cada um deles torne possível o que foi profetizado.
Uma das características que mais chama a atenção no imaginário vieiriano é o esforço de agrupar leituras díspares sobre o tema do futuro, que confirmem a instauração de uma Terrena Cidade Celeste, como a nomeou Neves (2003). Para tanto, conclama os homens à conversão e à ação de levar ao conhecimento de todos os mistérios do Reino de Deus. Nisso reside parte importante da produção de Vieira, e também de sua personalidade: escrevia, fazia as prescrições sobre o que havia de ser feito, mas apontando sempre para a necessidade imperiosa de agir. Ele mesmo era um exemplo vivo daquilo que pregava. Segundo Afânio Coutinho (1986, p. 86), “em Vieira, o pensamento e a ação, em escala sempre descomunal, fundiam-se de modo vivo e enérgico, não havendo como isolar um do outro em suas obras”. E é o próprio Vieira quem afirma, categórico: "Quando vos perguntarem quem sois vós, não vades revolver o nobiliário de vossos avós, ide ver a matrícula de vossas ações. O que fazeis, isso sois, nada mais" (1957, v. 11, p. 439).
Vale lembrar, neste ponto, aquilo que Sahlins (1990) denominou de caráter prescritivo e de caráter performativo da sociedade. Vieira cabe bem nos dois modos de proceder social: por um lado, lega normas cuja observância é indispensável na preparação da chegada do Reino; por outro, vai às missões “garimpar” almas para que seu intento se efetive. O escrito, portanto, não vale mais do que a ação. Ambos são imprescindíveis e complementares, para que se consiga alcançar o objetivo imaginado.
Outro aspecto importante a destacar é o de como Vieira concebe o futuro. Não se trata, no caso, de algo totalmente inaugural, que não traga elementos e aspectos do passado; ao contrário, o futuro deve ser visto como um ideal que novamente virá a ser. Não é de um passado recente que Vieira fala, mas de um tempo mítico. O futuro seria a (re)instauração do Éden perdido, de modo que os homens restabelecessem seu contato com Deus. As profecias, para Vieira, eram como um tesouro, apenas à espera de que alguém, bafejado pela inspiração divina, o trouxesse à luz, desvelando o futuro que jazia ignorado:
A mescla de imagens radicalmente novas com outras já passadas faz pensar no que Durand (2001b) propõe como sendo uma das características do imaginário: parte de transformação, de surgimento daquilo que é radicalmente novo, com outros elementos, provindos da memória. Esse amálgama tambémQuantas vezes os que trabalham no descobrimento de algum tesouro, cavam por muitos dias, meses e anos sem acharem o que buscam, e depois de cansados e desesperados, sucede vir um mais venturoso, que descendo sem trabalho ao profundo da mesma cova, e cavando alguma coisa de novo descobre a poucas enxadadas o tesouro, e logra o fruto dos trabalhos e suores dos primeiros? Assim aconteceu no tesouro das profecias: cavaram uns e cavaram outros, e cavaram todos, e no cabo descobre o tesouro, quase sem trabalho, aquele último para quem estava guardada tamanha ventura, a qual sempre é do último (VIEIRA, 1998, p. 188).
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se dá na concepção vieiriana do futuro. Há um rei que ressuscita este mesmo monarca que já havia tido importante papel na história de Portugal3, que viria a desempenhar outro, igualmente importante, no futuro.
Em seu exercício de conhecer e revelar as coisas futuras, Vieira, na Clavis Prophetarum (2000), lançando mão de textos bíblicos, argumenta sobre o proveito e a licitude daquilo que empreende. Cita diversos textos de autoridades (p. 11-33), de Isaías a Santo Agostinho, nos quais se procura dissuadir os homens a tentar manter a curiosidade sobre os tempos futuros. Curiosa estratégia esta, de lançar dúvida sobre se o que faz – perscrutar o futuro – está de acordo com o que professam as Sagradas Escrituras. Quando se inicia a leitura, o que parece é que Vieira fará uma reprimenda àqueles que, por “vaidade”, tentam conhecer o futuro. Inventaria opiniões contrárias à prática da profetização, mostrando, inclusive, que se os homens nem ao menos conseguem concordar sobre o passado, quanto mais em relação ao que ainda está por vir!
O livro parece, assim, perder sua própria razão de ser. Pois se a Clavis Prophetarum fala das profecias, das suas “chaves”, como pode seu autor buscar o caminho inverso? Todavia, chegando ao segundo capítulo (VIEIRA, 2000,p. 37), lê-se o seguinte título: “Resolução da questão: afirma-se e prova-se a parte afirmativa”. É deste ponto que veremos Vieira reiniciar seus argumentos para operar aquilo que, contraditoriamente, parecia não ser lícito fazer. Diz o jesuíta:
Não obstante estas objecções, a que mais tarde satisfaremos, é universalmente certo que podemos não só discorrer acerca dos tempos em que hão-de realizar-se coisas futuras, e indagar e pesquisar diligentemente quando e durante quanto tempo hão-de existir, mas também estabelecer ao certo muitas perspectivas sobre esses tempos, ou dar a seu respeito uma opinião provável (VIEIRA, 2000, p. 38).
O discurso vieiriano movimenta-se num ir-e-vir constante, fazendo com que cada argumento seja edificado sobre alicerces cada vez mais consistentes, que o escritor busca mediante um jogo de correspondências com as Sagradas Escrituras. Certo está que as referências ao texto bíblico têm de ser convergentes com as proposições que ele faz, mas de qualquer maneira Vieira também toma citações que parecem contrárias ao exercício da profecia, para depois demonstrar que é necessário que se compreenda o que a Bíblia diz.
A concepção mesma de futuro pode variar. Em Esperanças de Portugal, por exemplo, o jesuíta procura datar o início do tempo das mudanças que levariam o mundo a (re)encontrar uma era de ouro. Seguindo as letras do Bandarra, dá como certo de que seria a partir do ano de 1666 que tudo se iniciaria, ou seja, a chegada de Dom João IV ressuscitado, a descoberta das tribos perdidas de Israel, dentre outros feitos, resultando na vitória sobre as heresias e a conseqüente instauração da nova ordem (Vieira, 2002).
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um anúncio do fim... A parusia (anunciação) se dá para que possamos gozar a vinda do Messias, que para o jesuíta é D. João IV.
Expressão do contraste: anunciação da chegada do Reino de Deus na Terra para a espera do Juízo Final. O tempo pode ser pensado assim: se algo de bom há de vir, é com a expectativa de um término... Ou pode ser pensado simplesmente como nova oportunidade de comunhão com a Divindade. O que prevalece? Aí está o que se poderia chamar de subjetividade do tempo. Cada ser pode pensar, em seu lugar, em sua concepção, o que deverá ser o futuro: um novo alvorecer ou a afirmação de que haverá de chegar o final.
O imaginário em contato com o futuro
Para articular a idéia de futuro com o imaginário, é necessário fazer algumas considerações. Augras (2000) afirma que a obra de Bachelard, apesar de ainda conservar uma concepção irracionalista sobe o imaginário, abre a possibilidade para que se passe a considerá-lo como algo mais do que um exercício de pura irracionalidade.
Bachelard ocupa uma posição singular entre os teóricos do imaginário. Partindo de uma reflexão epistemológica sobre a formação do pensamento científico, em que a ciência, ‘estética da inteligência’, é vista como um processo constante de depuração de ‘aproximação racional do real’ (Bachelard, [1927] 1970; 103), vai desenvolver paralelamente uma produção que valoriza a criação poética. (AUGRAS, 2000, p. 115)
Enquanto Sartre havia deixado clara a sua posição contrária a qualquer valorização do imaginário, e Lacan só via neste uma etapa a ser superada para que adviesse o simbólico, Bachelard propõe algo diferente. Augras (2000, p. 116), referindo-se às perspectivas de Bachelard sobre o imaginário, diz que, para ele, “a imaginação constitui um reino autônomo, irredutível a outros modos de conhecimento. Mais ainda, ao abrir a via imaginal de percepção do mundo e de nós mesmos, o reino das imagens nos cria” (grifo da autora).
Os trabalhos de Bachelard são ricos em elogios a toda possibilidade de se pensar o imaginário. As imagens nos criam, nos facultam viver no mundo (Cassirer, 2003). A linguagem mítica dá o tom de nossas vidas. “O mito é uma fala”, disse Barthes (2001, p. 131). O imaginário é digno de estudo, mas há que se ter noção da separação das linguagens. “Em outros termos, o saber ficaria do lado racionalista, enquanto a fenomenologia da imagem poética remeteria ao sabor (AUGRAS, 2000, p. 118; grifos da autora).
Essas considerações remetem à perspectiva adotada por Durand sobre o imaginário. No início de sua apresentação à obra durandiana, Augras afirma:
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A definição do imaginário como capital antropológico possibilita estabelecer o diálogo entre as diversas ciências do homem. Não há mais antagonismo entre razão e imaginação, que são, ambas, ferramentas na construção do mundo. Construção no modo simbólico, é claro que, aos olhos de um cassireriano convicto como Durand, torna-se sinônima da própria criação do homem e do mundo (AUGRAS, 2000, p. 119).
Uma das diferenças de Durand com relação a Bachelard encontra-se no fato de que, para o primeiro, razão e imaginação não se situam em campos distintos e irredutíveis. Durand busca uma unificação das ciências humanas e sociais para que, dessa maneira, seja possível investigar o imaginário em todas as suas vertentes e possibilidades. Esta é a riqueza do imaginário, que torna-se, assim, capital antropológico.
Em sua obra mais importante, As estruturas antropológicas do imaginário (2001), Durand faz um recenseamento das teorias que tratam do imaginário, principalmente a fenomenologia sartriana, a psicologia clássica, a Denkpsychologie, dentre outras, como as de Bergson, Alain, Taine. Em todas, Durand observa um reducionismo do imaginário que faz com que este seja interpretado como “ficção”, “quase idéia”, “consciência em estado nascente” ou, simplesmente, “memória”:
Sartre mostrou que os psicólogos clássicos confundem a imagem com o duplicado mnésico da percepção, que mobilia o espírito com ‘miniaturas’ mentais que não passam de cópias das coisas objetivas. No limite, a imaginação é reduzida pelos clássicos àquela franja aquém do limiar da sensação que se chama imagem remanescente ou consecutiva (DURAND, 2001b, p. 21).o
Indica, então, que o imaginário, mesmo que tendo uma parte que é memória, também – e principalmente – carrega em si um elemento novo, que surge da criação. Isto, justamente, é o que irá permitir ao imaginário se revestir de força e importância. A concepção do imaginário como potência encontra ressonância na obra de Durand.
Enfim Bachelard faz repousar a sua concepção geral do simbolismo imaginário sobre duas intuições que faremos nossas: a imaginação é dinamismo organizador, e esse dinamismo organizador é fator de homogeneidade na representação. Segundo o epistemólogo, muito longe de ser faculdade de ‘formar’ imagens, a imaginação é potência dinâmica que ‘deforma’ as cópias pragmáticas fornecidas pela percepção, e esse dinamismo reformador das sensações torna-se o fundamento de toda vida psíquica porque ‘as leis da representação são homogêneas’, a representação sendo metafórica a todos os seus níveis e, uma vez que tudo é metafórico, ‘ao nível da representação todas as metáforas se equivalem’ (DURAND, 2000, p. 30).
Essa definição é aplicável ao pensamento vieiriano, no que tange às suas concepções de mundo e de futuro. Não somente pelo fato de serem proposições que indicavam – e criavam – algo “radicalmente novo”, mas também por tratarem de “criação de vida”. Não é possível esquecer, porém, o papel da memória naquilo que o jesuíta propõe. Nem seria necessário, já que o próprio Durand reconhece o papel
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fundamental da memória para a imaginação. A mescla do novo com o mnemônico traz, de qualquer modo, algo que é, basicamente, também novo. Veja-se este exemplo, extraído da História do Futuro:
Mas deixados os exemplos das Escrituras e profecias canônicas, ouçam também as nossas, que sendo de inferior autoridade, também foram ditadas, como depois se verá, pelo mesmo espírito. Porque puderam romper os portugueses os claustros impenetráveis do oceano e conquistaram nas outras três partes do mundo, tendo um reino tão pequeno, tantas, tão novas e tão poderosas nações, senão porque estava escrito? (VIEIRA, 1998, p. 144-145).
Em consonância com Bachelard, Durand contesta a perspectiva simplificadora, que faz da imaginação uma pura “reprodução mnésica” do objeto, tornando-se, dessa maneira, um simulacro da coisa. Todavia, ao afirmar a existência de um “dinamismo organizador”, de uma “potência dinâmica” na imaginação, Durand chama a atenção para o fato de que esta possui uma autonomia criadora. A imaginação pode, então, ser pensada como imagem-em-ação.
Essa conclusão provavelmente causaria desagrado aos defensores das teorias de Sartre, Lacan e dos clássicos, ou seja, aqueles que reduzem o papel da imagem a uma cópia mal feita do objeto. Há, no entanto, outras possibilidades de definição para o imaginário, que aproximam teorias aparentemente díspares. Como exemplo, tomemos mais um trecho de Augras, para traçar um paralelo entre duas teorias que podem, por vezes, ser consideradas antagônicas:
Reafirmando que o mito só se pode entender pelo mito, e a imagem, pela imagem, [Durand] justifica novamente o princípio de uma ‘leitura cumulativa’ de imagens e símbolos. Durand chama de transversalidade [transversalité] o método que consiste em confrontar mitos – descritos ainda como encenação [mise-en-scène] do símbolo, enquanto o símbolo seria o emblema da ‘lição mítica’ – entre si, e pôr para dialogar produções coletivas e individuais (AUGRAS, 2000, p 122).
Assim, seria possível apontar um “paralelismo” entre a teoria durandiana e a teoria lacaniana. De que maneira? Ao afirmar que um mito só se entende por outro mito, e uma imagem por outra imagem, Augras evoca a conhecida proposição lacaniana: “um significante só tem sentido em relação a um outro significante” (Lacan, 1998b). Essa “cadeia associativa” formadora de sentido pressupõe que seja necessário um elemento (no caso, o significante) associado a outro, para que o primeiro se torne inteligível. Não há possibilidade de operacionalização de um significante se este estiver isolado. Da mesma forma, pode-se dizer que uma imagem isolada não encontra ressonância, mas tão-somente em contato com outra. Um ponto não pode ser explicado em um fundo branco, quer dizer, ele não significa por si. Ao inserirmos uma outra imagem, aí sim este ponto encontra sua significação, ou melhor dizendo, seu efeito de significação.
Lacan (1998b) sustenta que nossos pensamentos e sonhos são formados por significantes, que formam o conteúdo de nossa psique. Ele parece sugerir que há um engodo da consciência, para que46
tenhamos a impressão de uma percepção de imagens em nossos sonhos e pensamentos. Não é possível pensar/sonhar imagens!, diria um lacaniano. No entanto, Castoriadis (2000) já comentava, com certo tom de ironia, sobre o equívoco dessa proposta:
Gostaria de chamar a atenção do leitor para um único ponto, a fim de evitar mal-entendidos. Aquilo que a partir de 1964, denominei o imaginário social – termo retomado depois e utilizado um pouco a torto e a direito – e, mais genericamente, o que denomino o imaginário, nada tem a ver com as representações que circulam correntemente sob este título. Em particular, isso nada tem a ver com o que algumas correntes psicanalíticas4 apresentam como ‘imaginário’; o ‘especular’, que, evidentemente, é apenas imagem de imagem refletida, ou seja, reflexo, ou, em outras palavras ainda, subproduto da ontologia platônica (eidolon), ainda que os que utilizem o termo ignorem sua origem (CASTORIADIS, 2000, p. 13, grifos do autor).
Castoriadis critica o que para ele é um erro das cogitações lacanianas: o desprezo pelo imaginário:
O imaginário não é a partir da imagem no espelho ou no olhar do outro. o próprio ‘espelho’, e sua possibilidade, e o outro como espelho são antes obras do imaginário que é criação ex nihilo. Aqueles que falam de ‘imaginário’ compreendendo por isso o ‘especular’, o reflexo ou o ‘fictício’, apenas repetem e muito freqüentemente sem o saberem a afirmação que os prendeu para sempre a um subsolo qualquer da famosa caverna: é necessário que (este mundo) seja imagem de alguma coisa (CASTORIADIS, 2000, p. 13).
E finaliza de modo contundente, desmantelando de vez o que é tratado como imaginário para essa parte da “psicanálise francesa”:
O imaginário de que falo não é imagem de. É criação incessante e essencialmente indeterminada (social-histórica e psíquica) de figuras/formas/imagens, a partir das quais somente é possível falar-se de ‘alguma coisa’. Aquilo que denominamos ‘realidade’ e ‘racionalidade’ são seus produtos (CASTORIADIS, 2000, p. 13).
Essa definição do imaginário parece bastante próxima daquilo que Durand também chama de imaginação. Criação incessante, o imaginário remete novamente à concepção vieiriana de futuro. Vieira imagina um mundo onde prodígios acontecem, mas sempre em consonância com as crenças milenaristas (LE GOFF & SCHIMITT, 2002, p. 353-366).
Durand (2000, p. 28) em sua crítica às concepções da psicologia clássica e da Denkpsychologie sobre o imaginário, lembra que elas “postulam um pensamento sem imagem apenas porque a imagem é de novo reduzida ao duplicado remanescente da sensação, donde naturalmente se conclui que tais imagens não acrescentam nada ao sentido das noções abstratas”. A crítica demonstra o quanto a imaginação está longe, para estas teorias, de conseguir um estatuto de objeto digno de estudo. Não são mais do que sombras da consciência, do pensamento e das idéias.
Seguindo adiante em suas considerações contrárias às concepções citadas, e tentando fazer um percurso que dê à imaginação o estatuto que ele crê seja o mais fidedigno de sua importância, Durand
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articula a linguagem à imaginação. Disto tira proveito para apontar os equívocos produzidos por outras teorias. Estas, confundindo a imagem com um signo arbitrário, fazem com que esta arbitrariedade do signo seja suficiente para dar um caráter desprezível à imaginação:
Mas é capital que notemos que na linguagem, se a escolha do signo é insignificante porque este último é arbitrário, já não acontece o mesmo no domínio da imaginação, em que a imagem – por mais degradada que possa ser concebida – é ela mesma portadora de um sentido que não deve ser procurado fora da significação imaginária (...). o análogon que a imagem constitui não é nunca um signo arbitrariamente escolhido, é sempre intrinsecamente motivado, o que significa que é sempre símbolo. É finalmente por terem falhado na definição da imagem como símbolo, que as teorias citadas deixaram evaporar a eficácia do imaginário (DURAND, 2000, p. 29).
Rechaçando, portanto, as perspectivas sartriana, bergsoniana, da psicologia clássica, da Denkpsychologie etc., Durand faz um percurso semelhante ao de Bachelard, e termina por buscar na teoria dos símbolos e arquétipos de Jung o caminho para a sua teorização.
As estruturas arquetípicas, somadas ao “capital” do inconsciente coletivo, fazem vicejar as teorias que valorizam a imagem como conteúdo representativo da psique (2001a). A partir desses elementos do pensamento durandiano, é possível entender o futuro como a conjugação de partes do passado – memória – com partes radicalmente novas, como é característico ao imaginário.
Conclusão
O futuro, conforme imaginado nos escritos proféticos de Vieira, pode ser definido como uma transformação a partir de feixes de memória – imprescindíveis na construção de um mundo novo – e de ações no presente. É da conjugação de ambas que depende a concretização do intento do jesuíta. Os textos proféticos de Vieira, remetendo-se a um futuro onde será restaurada a idade do ouro de Portugal, são um amálgama de misticismo com preocupações bastante mais terrenas, envolvendo aspectos econômicos, sociais e políticos, sem que haja, não obstante, perda da dimensão propriamente religiosa de seu discurso. Ao contrário, a argumentação do jesuíta busca sua força num jogo de correspondências entre os acontecimentos seculares e as Escrituras.
A exuberância imagística – característica ao Barroco e ao estilo pessoal de Vieira escrever – magnífica e profusamente representada em Esperanças de Portugal, na História do futuro e na Clavis prophetarum, é utilizada pelo jesuíta, nestas obras, como um recurso na construção de um futuro venturoso para Portugal, com o qual o jesuíta sonha. Atuando ao mesmo tempo, entretanto, como um homem de Estado, ao articular a restauração do trono português, subjugado à Coroa espanhola por longas décadas. O Vieira imaginoso, assim, caminhava pari passu com o Vieira industrioso, de tal modo que aos sonhos de um correspondiam as ações do segundo, e vice-versa, na busca pela concretização de um objetivo que era ao mesmo tempo místico e político.
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Vieira procura, em sua escrita profética, construir uma história que, diferentemente das tradicionais, não se remeta ao passado, mas àquilo que ainda está por vir; uma história que manifeste ao mundo segredos ocultos. Para justificar e, no mesmo movimento, legitimar o exercício da profetização, Vieira (1998), articula a mitologia grega com a tradição exegética católica, no sentido de estabelecer uma genealogia dessa “ciência dos futuros” – como a denominou Platão –, cuja posse distingue os Deuses dos homens. O imaginário vieiriano, dessa maneira, não é inefável nem estático, mas, muito concreta e dinamicamente, produz possíveis futuros e atualiza passados míticos; potencializa a criação, o novo; faz do símbolo algo além de uma representação, o duplo de um modelo – sendo somente este modelo o que tem estatuto de verdade (DURAND, 1995; 2000). Destas bases, vêm os estudos sobre a hermenêutica, sobre a alma, sobre as divindades, sobre Deus...
Neves (1998) alerta sobre o perigo de se tomar as obras proféticas de Vieira como a parte excêntrica, e menor, das obras do jesuíta. Na verdade, o próprio Vieira considerava que seus sermões eram apenas “choupanas”, se comparados com a parte mais rica de sua produção: seus escritos proféticos, os “palácios” de seu exercício intelectual, aqueles que assegurariam um lugar para o seu nome na posteridade. Neste mesmo sentido, Neves procura escoimar a profetização – enquanto ação direta do imaginário – da acusação de irracionalismo que lhe é atribuída. Além de negar que exista uma cisão irredutível entre o pragmatismo e o profetismo vieirianos, diz que “esta imperial Razão parece falar em nome da história – e de um conhecimento histórico que, entretanto, não consegue distinguir que o racionalismo, ele mesmo, tem uma história”. (NEVES, 1998, p. 144).
O futuro, desafio permanente para os homens, pode ser conhecido através de intenso labor do pensamento e da razão. Razão que o jesuíta jamais abandonou, e que se desdobrou para fazer coincidir com sua fé. Vieira não se lançou a uma aventura solitária desprovido da crença em Deus, mas procurou fazer coincidir os termos da Sagrada Escritura com textos que apontavam para um porvir no qual Portugal seria elevado à condição de Quinto Império do Mundo. O futuro imaginado por Vieira não dizia respeito às suas vontades, mas sim à vontade de Deus. O jesuíta buscava, “apenas”, compreendê-lo e traduzi-lo a partir de referenciais que foram, infelizmente para ele, considerados malditos para os poderosos da Igreja.
Indultado pelo Santo Ofício, após ter cumprido uma pena de silêncio pela difusão de “idéias heréticas”, Vieira deu prosseguimento ao seu exercício de antecipar o futuro por meio da Clavis Prophetarum, obra maior de seus esforços como profeta. A firmeza de seus princípios e sua obstinação em afirmar um futuro, são marcas de um imaginário que não se decompõe e não se corrompe diante das dificuldades. Não poder falar ou pregar durante vários anos não demoveu Vieira de sua fé; antes, como que duplicou-a. O imaginário vieiriano sobreviveu – e sobrevive – em seus escritos sobre um mundo que ele próprio não teve a oportunidade de conhecer. Entretanto, o que se mostra em sua obra é suficiente para confirmar seu vigor imaginativo, que a tudo se impõe. Neste sentido, os escritos proféticos de Vieira são exemplares para confirmar a força que advém do exercício da imaginação.
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